Quando falamos de uma criança, nunca a podemos ver num contexto isolado, mas sim num contexto com uma multiplicidade de fatores intervenientes. A preocupação parental e a satisfação das necessidades educacionais, alimentares e psicológicas da criança são proporcionais à formação do carácter do indivíduo (Silva,2008). Certamente que ser um bom pai ou uma boa mãe, é provavelmente uma das tarefas mais difíceis na vida, principalmente quando nos deparamos com o divórcio, e o foco passa inevitavelmente a ser o filho. Tal como ressalva Souza (2000), existe um longo período entre a crise pré-separação e a realização de um novo patamar familiar, sendo este o período de maior risco para a potencialização de distúrbios infantis.
No entanto, importa salientar que, e tal como sugere a literatura, não são as mudanças estruturais da família nem o divórcio em si que desencadeiam as perturbações nos filhos, mas sim as circunstâncias que surgem da separação (Santos, 2008), nomeadamente a exposição dos filhos ao conflito parental, a compensação material e ausência de tarefas parentais.
De acordo com Busaniche Cunto, Eymann, Llera, & Wahren (2009), a separação dos pais é muitas vezes a primeira grande mudança na vida da criança e altera drasticamente o futuro familiar devido à rutura das rotinas normais e à ausência do contacto diário com ambos os pais. Perante uma evidente falha cometida pelos pais, geralmente associadas à falta de atenção e falta de tempo, estes assumem sentimentos de culpa, admitem o erro e tentam corrigi-lo com um outro, o que despoleta a compensação material e a satisfação das vontades da criança (Silva, 2008). E isto é, nada mais, nada menos, aquilo que vemos hoje, quando olhamos para o lado numa loja de brinquedos ou num supermercado. Sem surpresa, com a compensação a criança percebe que conquista o progenitor e manipula-o de modo a atingir os seus caprichos. E se pensa que as birras são uma atitude negativa, desengane-se. As birras são uma manifestação do desenvolvimento normal das crianças e fazem parte das etapas do desenvolvimento, perceber que já se podem fazer ouvir e impor a sua vontade.
No entanto, ceder não é a atitude certa, mesmo que se sinta culpado por não passar muito tempo com ela e a querer compensar por isso. Ao ceder, vai dar a entender à criança que as birras são perfeitamente aceitáveis para conseguirem aquilo que querem e, pior que isso, estará a criar um ciclo vicioso que se tornará cada vez mais difícil de controlar e ultrapassar. Já nesse patamar surgem então as birras incontroláveis e agressivas, resultado dos comportamentos precedentes. Esta é a forma que a criança tem para demonstrar a tensão causada pela situação, sem contudo isso manifestar um carácter patológico (Berger (1998) citado por Martins (2010)).
Já no que se refere à ausência de tarefas familiares é crucial e de extrema importância incentivar a sua definição, pois tal como refere Barros (2010), desta forma permite-se a estruturação do meio e das rotinas, de modo a alcançar os objetivos definidos. Em conjunto com o filho, é sempre importante negociar alternativas relativamente aos hábitos atuais , (e quando se fala em hábitos fala-se em todos, sem exceção!), incluindo a alimentação e as horas de sono, a fim de modelar os comportamentos da criança, sem com isso influenciar drasticamente a sua rotina.
Tendo em conta os aspetos mencionados, existe uma grande área a abordar de maneira a atenuar as dificuldades infantis e, parte significativa, diz respeito às atitudes dos pais. Posto isto, importa realçar a importância da ação positiva dos pais e a redução dos fatores de risco, na medida em que fomentam bons níveis de resiliência das crianças, facilitando melhor adaptação ao processo de divórcio. (Barnes (1999) citado por Silva (2008)). Para além disso, os profissionais que estão em contacto com as crianças, como o médico ou o enfermeiro, desempenham um papel muito importante na redução do stress pois estão numa posição de elaborarem e implementarem novas intervenções orientadas para a proteção e prevenção de distúrbios. Paralelamente, é essencial que os pais compreendam a sua ação como educadores para a saúde a médio e longo prazo, e no contexto da multiplicidade de influências que determinam o desenvolvimento do filho (Barros,2010).
CV: Enfermeira pela Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho